O projeto visa registrar em vídeos as histórias contadas por moradores da fronteira sul do BrasiL. Os cinco vídeos iniciais registraram as narrativas colhidas no território compreendido entre a Barra do Chuí e a cidade de Pelotas , incluindo Santa Vitória do Palmar, Rio Grande e São José do Norte. As histórias contadas fazem parte da memória que constitui estes lugares e são relatadas por moradores que ainda cultivam o hábito de reunirem-se em torno do Chimarrão (bebida quente típica desta região) para longas conversas num dilatamento de tempo que parece não ter mais lugar nos grandes centros urbanos. Cada vídeo, com duração em média de doze minutos, é acompanhado de um livro de artista constituído de desenhos ou anotações de viagem. Estes registros ficam a disposição no site www.almendares.com.br/maravilhas .
 

Estação Balneária As Maravilhas
contos das rodas de chimarrão – uma memória afetiva

No extremo sul do Brasil, em uma faixa de terra outrora denominada Campos Neutrais, na época isolada do restante do país por extensas planícies e intransponíveis alagados das terras do Taim, encontra-se Santa Vitória do Palmar. Cidade que tem na origem da formação de seu povo tipo singular como o Changador, vindo da miscigenação do índio com o espanhol e o português. Homens solitário, rebelde a qualquer lei.


Em luta com este ou fazendo uso de sua bravura para combates estavam  os estanceiros e Caudilhos, herdeiros de terras distribuídas em sesmarias ou por pagas a feitos de guerra nas intermináveis disputas de fronteiras entre a coroa portuguesa e espanhola.

Episódio1

Estação Balneária As Maravilhas

 

A Estação Balneária As Maravilhas, tema inicial deste projeto,  surge na década de 40 do século passado por iniciativa de um estanceiro da região. Local de encontro, divertimento e relatos, nas rodas de chimarrão de aventuras tais como as perigosas viagens pelas areias do mar, que por muito tempo foi a única rota terrestre de comunicação entre Santa Vitória e a progressista cidade de Rio Grande. O contrabando que desde sempre fez parte da história da região e era relatado de forma romantizada nas rodas noturnas em torno do amargo. A navegação pela Lagoa Mirim, outra forma de contato entre Santa Vitória e o restante do país, também rendiam belos relatos. Posteriormente a “estrada do inferno”, responsável por quebra de eixos de valentes Austins e encontros solidários de viajantes sempre prontos a socorrer colegas de destemidas aventuras.

Estas histórias que constituem a memória desta região tão rica culturalmente e significativa na demarcação das fronteiras do extremo sul de nosso país, que fazem parte da memória da minha família e que são tão caras ainda hoje aos habitantes daquela região, é que serão registradas neste projeto.

O Porto de Santa Vitória do Palmar  

Numa tarde quente de janeiro nos dirigimos para o Hermenegildo, uma das praias do litoral sul. Lá encontramos o  professor Homero Vasques que nos falou sobre o Porto de Santa Vitória do Palmar. Desta vez eu estava acompanhada de meu pai, Air Almendares, amigo do professor desde a infância na cidade de Santa Vitória. 
Na juventude foram os dois para Porto Alegre completar os estudos onde o pai permaneceu, constituiu família e fez carreira na Secretaria da Fazenda.. Homero foi para  Pelotas onde concluiu sua graduação em história e retornou a Santa Vitória tornando-se admirado professor e escritor.

Por um caminho de terra chegamos a bela casa à beira mar,  para uma longa e agradável conversa. Seu relato completo apresenta um panorama de toda a ocupação do extremo sul pelo homem, desde os índios, os colonizadores europeus até a fundação da cidade de Santa Vitória do Palmar. Como nosso foco neste vídeo é o Porto da cidade foi necessário realizar um recorte no depoimento, mas ficamos com um belíssimo material para um próximo vídeo focado  na cidade de Santa Vitória do Palmar.
   
A Ilha dos Marinheiros e a Lagoa das Noivas  

Visitar a Ilha dos Marinheiros é entrar em outro universo. 
A placa turística já na chegada apresenta muito bem a ilha. Pintada por um artista de Rio Grande  ela dá o tom singelo do lugar. Detalhadamente estão localizados os principais pontos turísticos. O Santuário Nossa Senhora de Lourdes, o Caminho do Rei que é como chamam os moradores o local de chegada à ilha do Imperador D.Pedro II, isso em 1845. Vemos também as capelas, tão bem  cuidadas que são:  Capela de São João Batista, Capela de Santa Cruz, Capela de Nossa Senhora da Saúde. Tem o local de comercialização da Juripiga, que é uma bebida de origem portuguesa produzida na região, e a Lagoa das Noivas.

Na ilha principalmente o tempo é outro. A estrada de chão já informa que a pressa não combina com aquela região. Raramente cruzamos com outro veículo. As casas, por vezes distantes uma das outras, ou agrupadas o que dá a ideia de famílias ocupando um terreno comum, guardam um silêncio e transmitem a tranquilidade do lugar. Muitas destas casas possuem uma cobertura  de lata típica da região o que despertou nossa curiosidade. A informação que conseguimos dá conta de que a lata é utilizada para proteção da madeira, é um costume da região...
   
São José do Norte o Espião Alemão  

O percurso de Rio Grande até São José do norte leva em torno de 25 minutos de lancha. Quando começo a avistar as construções de São José do Norte a que primeiro se mostra é a igreja com suas duas torres.. Sempre linda e imponente mesmo na sua simplicidade. Em seguida  inicio a invariável tentativa de localizar os pontos familiares.  Onde estará o barco do Renato? E a casa de seu Otávio? E a do Dega E assim vai... Até que atracamos e encontro a cidade numa alegria só e numa paz invejável. A praça... a igreja..... as ruas...

Pois nesta cidade mora seu Otávio. Pessoa encantadora, definido pelos amigos como um homem crítico e por ele mesmo como alguém sem travas na língua, coisa que já lhe rendeu algum incômodo. Seu Otávio foi vereador e hoje mora em uma adorável  casinha construída por ele num solo também construído por ele através do aterro da lagoa o que consiste em grande orgulho em sua vida.
Entre tantas histórias que nos contou apresentamos aqui a do Alemão Espião que aconteceu no período da segunda guerra mundial.
   
A Ilha da Feitoria e o povo que se apaixonou  

A ilha da Feitoria guarda grande contradição entre tragédia e beleza sem par. Ao chegarmos encontramos tudo muito alegre com visitas ao seu Negrinho de amigos pescadores que costumam passar por lá, inclusive alguns ainda possuem casa na ilha.
À sobra de uma majestosa figueira, numa roda de conversa, as histórias foram sendo reveladas e seu Negrinho  usou uma expressão que me marcou. Ao relatar uma das  tragédias que se abateu sobre a colônia ele falou ao se referir a tão grande tristeza,  que o povo se apaixonou e deixou a ilha.